É proibido chorar!
Você se sente à vontade para expressar suas emoções no trabalho?
Certa vez, quando ainda trabalhava no mundo corporativo, entrei na sala de um executivo da empresa para uma reunião e perguntei o trivial:
– Tudo bem com você?
Ele me respondeu com um “sim” hesitante. Insisti:
– Está tudo bem mesmo?
A pergunta desencadeou um choro doído, mas ele logo enxugou as lágrimas e pediu desculpas. Contou-me que estava com um parente próximo gravemente doente na UTI e que seu cachorro, parceiro de muitos anos, morreu naquela semana.
Perguntei por que ele pediu desculpas e a resposta foi:
– Porque aqui não é lugar de choro, pois chorar é sinônimo de fraqueza.
Calei-me por alguns segundos. A dor dele doeu em mim, e doeu também perceber que, de certa forma, ele tinha razão. A organização não dava espaço para “sensibilidades”.
Chorar, respondi a ele depois, era para mim sinônimo de grandeza.
É possível guardar emoções em uma “caixinha”?
Ver que muitas empresas ainda tratam com negligência as emoções dos colaboradores, me entristece. Como se fosse possível, ao passar o crachá ou juntar-se a uma reunião do zoom, deixar numa caixinha esta dimensão humana ainda mais essencial em tempos de distanciamento físico. Sabemos que, em cada interação, em cada reunião, em cada decisão, lá estão elas e eles, emoções e sentimentos, “embaixo da mesa” tomando conta, desde o invisível, de tudo que acontece.
Uma pesquisa da consultoria Kantar, entrevistou 18.000 funcionários em 14 países e apontou que, globalmente, mais de 1 em cada 3 funcionários (38%) enfrentam problemas de saúde mental, incluindo algum distúrbio diagnosticado ou estresse. Além de 29% dos colaboradores no mundo relatarem que sofrem de ‘perda de energia’ ou ‘fadiga avassaladora’. E isso, antes da pandemia. Você consegue imaginar alguém, com fadiga avassaladora, realizando seu propósito no trabalho e/ou entregando valor à organização?
É algo bem desafiador e desgastante. Talvez, no curto prazo, até funcione. Mas a que preço? Todo este caldeirão emocional indesejado e subestimado alimenta monstros que minam o engajamento, contaminam relações e, em médio e longo prazo, afetam os resultados.
Organizações como espaço para promoção de saúde
Este momento coletivo de uma grande parada, em função do isolamento desde março, pode ser terreno fértil para a revisão de muitas práticas na vida e nas organizações.
Felizmente, vejo emergir lampejos de conscientização de líderes e empresas para a questão da saúde mental, mas ainda há um longo caminho até conseguirmos tornar o ambiente organizacional um espaço para promoção de saúde, no sentido mais amplo da palavra (física, mental, emocional, social e espiritual). E romper de vez com o ciclo negativo das organizações como ambiente propício para patologias do corpo, da mente, e da alma.
Se hoje eu encontrasse aquele executivo que mencionei no início do texto, completaria minha resposta dizendo que “vulnerabilidade é sinônimo de grandeza”. Grandeza de quem se sabe e se mostra humano com letras garrafais; de quem cultiva o equilíbrio em suas emoções por meio da autocompaixão e compaixão; de quem se dispõe a estar na arena “sangrando e suando”, como diz Brené Brown, construindo para si, para o outro, para a organização, e para o mundo, espaços seguros e saudáveis de ser e de estar.
Vamos juntos construir organizações mais saudáveis e prósperas?